Em qualquer situação, o sofrimento é igual
Enquanto
ela namorava o caixa do Banco em que tinha conta, tudo andava bem. O rio fazia
o seu caminho incólume, sensato e previsível como um rio deve ser. E parecer.
Havia jantares à luz de velas em que o
caixa cozinhava, servia e lavava as louças antes de abrir outra garrafa de
vinho e se acomodar junto dela para assistir a um filme de terror.
A acordava com café na cama e uma rosa
vermelha para alegrar o dia, antes de colocar o paletó azul, ajeitar a gravata
e sair assoviando um samba patético dessas rádios FM direcionadas a determinado
público.
Eram dias rotineiros e sem medo de
coisa alguma. Uma vidinha tranquila, sem sal, sem surpresas. O que a maioria
dos viventes deveriam desejar em um mundo ideal.
Então surgiu uma pedra no meio do
caminho, maior do que a pedra do famoso poeta para atrapalhar a rotina
modorrenta com a qual ela estava acostumada.
Uma troca se fez necessária e nossa
heroína aplicou um bico na parte traseira da anatomia do pobre caixa, passando
a relacionar-se com um gerentão da mesma agência. A partir desse instante houve
mudanças sutis que em pouco tempo se tornaram radicais.
O caixa, apalermado pelo tombo passou
a cometer dezenas de falhas, culminando com um desfalque que o fez perder o
emprego e puxar alguns anos de cadeia, com o coração partido e sem perspectiva
de recuperação.
O
gerentão chegou arrebentando na ostentação, oferecendo regalias nunca antes por
ela conhecidas; passeios de carro importado, flores às dúzias, das mais
exóticas e caras entregues sempre por um funcionário da floricultura...
Gabou-se do quanto faturava para a empresa e para si mesmo, falou de ações e
investimentos, valorizou os contatos para escolher as festas mais lucrativas,
lotadas de pessoal influente em vez de momentos íntimos de diversão. Nada de
amigos, apenas parceiros de negócios.
Em pouco tempo ela começou a enxergar
a si mesma como a esposa-troféu, alimentada, vestida e treinada como a um rato
de estimação, para ser exibida convenientemente de tempos e tempos.
A vida financeira bem resolvida
suplantou a vida amorosa saudável e tranquila.
Hoje ela se pergunta se a decisão
tomada foi a correta, abandonando o caixa pelo conteúdo da caixa, a dádiva de
um amor tranquilo pela classe de um amor ao dinheiro.
No final das contas chegou à conclusão
de que existe um empate no que diz respeito a ambos meios de “amar”, e diz
respeito ao sofrimento. É igual em qualquer das situações.
Marcelo Gomes Melo
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